quarta-feira, 28 de abril de 2010

FOLIA DE REIS: ORIGEM


A Folia de Reis chegou ao Brasil com os portugueses, na era colonial. Aqui, espalhou-se por todas as regiões brasileiras, tanto nos pequenos povoados, como nas grandes cidades.

Câmara Cascudo ("Dicionário do Folclore Brasileiro") diz que no século XVI "inicia-se a dramatização com canto e dança, recebendo contribuição dos cantos populares e a produção literária anônima em louvação ao Divino Natal”.

A maioria dos estudos atribui origem Européia às folias, talvez relacionadas às “Jornadas de Pastorinhas”, meninas-moças que no período litúrgico do Natal percorriam as casas pedindo esmolas com finalidade assistências, usando a música como pedido e agradecimento.

As “Companhias de Reis” eram inicialmente um revisão camponesa do que as pastorinhas faziam nas cidades, que mudou com o tempo acrescendo ritos que são mantidos até hoje. As letras alteraram-se, mas as melodias são as mesmas, fazendo parte do cancioneiro religioso do catolicismo ibérico.

FOLIA DE REIS: CARACTERÍSTICAS


As folias de reis são compostas por um número variado de participantes ou foliões. Podem aparecer vestindo uniformes, mas de forma geral, vestem roupas comuns, portando ou não uma echarpe branca em volta do pescoço, símbolo da pureza do Menino Jesus, de Maria e dos próprios foliões.

Caminham de casa em casa cantando e portando instrumentos como caixa, viola, violão, cavaquinho, rebeca, bandolim e sanfona variando sempre de região para região. As violas e os violões são enfeitados com fitas coloridas que podem carregar um simbolismo: as amarelas, cor-de-rosa e azuis podem simbolizar a Virgem Maria, sendo também que a cor-de-rosa tem por significado os doze apóstolos de Cristo. A fita branca representa o Divino Espírito Santo.

Os cantos são de "chegada", onde o líder ou embaixador pede permissão ao dono da casa para entrar, "saudação" à lapinha e "despedida", onde a Folia agradece as doações, a acolhida e se despede. O canto é tirado em solo pelo folião-mestre. Os outros foliões respondem em coro, inserindo a "requinta", um agudo bem prolongado. Em algumas regiões as canções de Reis são por vezes ininteligíveis, dado a sensação de um "caos sonoro" bem típico.

As danças são parte das folias e feitas normalmente pelos bastiões, palhaços ou alferes e podem ser diversas, conforme a região, como a dança-da-jaca, balanceado, cateretê, do meio dia e outras.

À frente do grupo caminha o bandeireiro ou bandeireira, pessoa responsável por carregar o símbolo que representa a folia: a sua bandeira. A bandeira possui várias configurações diferentes apresentando aspectos da folia que representa.

Feita normalmente de tecido, é enfeitada com flores de plástico ou de papel e fitas coloridas, sempre costuradas e nunca amarradas com nó cego ou alfinetes para, segundo a crença, não “amarrar” a Companhia ou atrapalhar sua jornada. Em algumas folias, as bandeireiras fazem uma revisão criteriosa nos enfeites para retirar aqueles que “amarram” a bandeira.

No corpo da bandeira são retratados temas variados, sendo os mais correntes a imagem dos Reis Magos ou da Sagrada Família. A bandeira se enfeita mais quando populares prendem nela os ex-votos como fotos, fitas ou pequenos objetos. Estes ex-votos a acompanham por toda a sua jornada ou peregrinação da folia e, ao término desta, são retirados e jogados em água corrente ou levados até o Santuário de Aparecida, na Região do Vale do Paraíba, Estado de São Paulo. Por tradição, não se pode jogar esses ex-votos em água parada, queimá-los ou guardá-los na casa dos foliões. Os adereços são sinal de devoção ou de cumprimento de promessa.

Sobre sua origem, é corrente a história de que, em agradecimento à visita ao Menino Jesus, os Santos Reis receberam de presente da Virgem Maria, um manto. Quando se afastaram, já na viagem de retorno ao Oriente, abriram o manto e viram nele a cena da visitação bordada, com os Santos Reis, a Sagrada Família, os animais e os pastores. Então, fizeram do manto uma bandeira e formaram a primeira Companhia de Reis, anunciando ao mundo o nascimento de Jesus.

RITUAL


As folias levam suas preces cantadas às casas dos foliões, porém sua função é precatória, ou seja, angariar fundos para a festa de 6 de janeiro, ou dia de Santo Reis.

Recebida a esmola, os foliões agradecem de formas variadas, podendo ser com danças e versos aos donos da casa. Geralmente, os donos da casa oferecem "pinga" da boa, café com biscoito ou até jantar.

A extensa seqüência ritual seguida pelos foliões consiste, basicamente, numa cantoria guiada pelo embaixador, na qual os foliões cantam diante do dono da casa pedindo licença para adentrar ou pousar. Entregam a bandeira com a imagem da Sagrada Família para os anfitriões que os recebe em sua casa. Cumprem promessas, cantam pedindo bênçãos aos moradores, pedem ofertas, agradecem os bens ofertados, pedem licença para se retirar da casa e, então, se preparam para a partida, podendo haver festa e bailes de encerramento e rito da entrega da doutrina.

PERSONAGENS


Respeitando as variações de cada lugar, podemos afirmar que, em linhas gerais, cada personagem envolvida no ritual da Folia de Reis exerce uma função.

Ao mestre ou embaixador, conhecido também por folião-guia, folião-mestre, capitão, gerente ou chefe, cabe a função de organizar e manter a coesão do grupo além de ser a voz que inicia as cantorias. É o posto mais alto da hierarquia dentro da Companhia e conhecedor dos fundamentos da folia, responsável pela transmissão dos saberes referentes à origem do grupo. Espera-se dele que conheça as tradições e toadas de Folias de Reis, pois há situações curiosas que exigem um conhecimento específico, como conta o senhor José Coppi, embaixador da Companhia de Sorocaba. Ele conta que houve situações em que a energia ambiental de uma casa era tão negativa que os instrumentos musicais da Folia se desafinavam sozinhos. Quando saiam daquele local os instrumentos voltavam à afinação. A Companhia conseguiu continuar graças aos conhecimentos do embaixador, que cantou uma toada especial para “quebrar” a sintonia daquele negativismo.

Os músicos, cantadores ou foliões são dividido por vozes, como quinta, contra-tala, tala, requinta. Especialistas em seus instrumentos procuram o aperfeiçoamento constante. Em coro, fazem as vozes da cantoria, compondo a toada característica da Companhia. Em outras regiões brasileiras é comum nas Folias a presença de pessoas caracterizadas de Reis Magos como personagens do grupo.

O bandeireiro ou bandeireira é a figura que, à frente da Companhia, conduz o símbolo que legitima o grupo, a bandeira. Sua função é cuidar da bandeira, contando com a proteção dos bastiões.

O festeiro, por sua vez, é a pessoa que se oferece e é escolhida para preparar a festa da chegada da bandeira.

O apontador de prendas anota todas as ofertas recebidas em um caderno.

Porém, o personagem mais curioso e mais intrigante é o “palhaço”, também conhecido como Bastião - corruptela de bastão que carregam e com eles, fazem malabarismos. Pai Juão, Catrina, Mocorongo, Malungo, Alferes, Mateus, Morengo, Pastorinhos são outros dos nomes que estes tão característicos foliões recebem pelo Brasil a fora. Vestidos com roupas coloridas usam máscaras feitas de vários materiais. (ver box: O bastião: guerreiro, palhaço e protetor)

O bastião: guerreiro, palhaço e protetor


Os Palhaços são os personagens mais curiosos das Folias de Reis. Sempre mascarados e vestidos com roupas coloridas, seguram em suas mãos a espada ou facão de madeira, com os quais defendem a bandeira. Se houver um encontro de bandeiras o Bastião deve defendê-la, cruzando sua espada com outros Bastiões sem dó! É o Bastião quem recolhe as ofertas, anuncia a chegada da bandeira nas casas, pergunta se o dono da casa aceita a visita, descobre as ofertas escondidas, “quebra os atrapalhos”, utilizando de gestos ou cerimoniais feitos por quem conhece a tradição.

O Cruzeiro de Flores é uma destas tradições muito antigas e que são utilizadas para testar o conhecimento dos Bastões: trata-se de uma cruz montada no chão com flores, em frente à porta de entrada da casa do visitado. Ao deparar com o Cruzeiro, o Bastião, e muitos acreditam que somente ele, deve recitar “profecias”, ou versos secretos.

O cruzeiro é formado por quatro braços. Para cada um deles o Bastião deve recitar uma “profecia” decorada e tradicional. Conforme encerra uma profecia, o Bastião desmancha um dos braços do cruzeiro com a ponta do seu facão, até desfazê-lo ao todo. Somente depois disso é que a Companhia pode adentrar no recinto e cantar as toadas. Ao contrário das toadas cantadas pelo embaixador, que são de improviso, as “palavras” ou “profecias” ditas pelo Bastião são decoradas.




Há muitas histórias que explicam o surgimento desses personagens. A mais comum é a que eram espias de Herodes que seguiram os Reis Magos para encontrar o Menino Jesus e matá-lo. Porém, ao encontrarem o Menino acabaram se convertendo. Com receio de serem mortos por Herodes, vestiam máscaras e viajavam com os Santos Reis. Iam à frente, fazendo graça e micagens para que Herodes não desconfiasse que eram seus próprios soldados.

Suas máscaras de papel ou couro imitam barbas e a postura de seus corpos invoca sentimentos inusitados, chamando nossa atenção. Na origem, as máscaras são para esconder seus rostos, para que Herodes não os reconhecessem como seus soldados, já que se converteram e tornaram-se protetores do Menino Jesus.

Trata-se de um personagem cômico, que pede as ofertas. É comum no meio rural, fazer o bastião “sofrer” antes de obter uma oferta. Às vezes o dono da casa se esconde e depois o surpreende, trava lutas corporais e agarramento sem nenhuma agressão física. Se o Bastião se sair bem, leva sua recompensa e recebe a oferta. Em outros locais solta-se um porco ensebado para que o Bastião o pegue. Esconder ofertas para que o Bastião procure e encontre é uma prática comum.

É de responsabilidade do Bastião, ainda, não permitir que lhe roubem a máscara ou a espada, afim de que a bandeira não fique “presa”. Para desprender a bandeira, o Bastião (ou o embaixador) deve dizer umas “palavras secretas”. Dizendo-as, a bandeira estará livre para prosseguir sua jornada.

Portanto além de curiosos, são intrigantes, sagrados e guerreiros, responsáveis pela proteção da bandeira e da folia.